Qual tipo societário devo adotar na minha startup?
Uma dúvida recorrente do empreendedor é qual arranjo societário deve adotar para sua startup. Isso porque, cedo ou tarde, o empreendedor precisará fazer a constituição formal da sua empresa para poder desenvolver sua atividade regularmente.
A resposta para a pergunta acima envolve o enfrentamento de vários aspectos, e perpassa por questões particulares dos fundadores.
O sistema jurídico brasileiro oferece alguns tipos societários, os quais detêm aspectos positivos e negativos. Nesse ponto, é preciso ter em mente que as relações de mercados travadas pela startup serão mais facilitadas ou não a depender do tipo societário escolhido. Por isso, deve-se ter muita atenção para a escolha ser a melhor possível.
Conforme aponta Feigelson e outros (2018), no contexto das startups, cabe o estudo das sociedades e não dos empresários individuais, o que se dá por questões realistas: a lógica do bootstrapping faz com que indivíduos se associem, buscando parceiros para a empreitada. Logo, a figura do Empresário Individual, Microempreendedor Individual (MEI) e mesmo a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI) não se mostram ideais para a formação de uma startup. Ademais, tais figuras dificultam o ingresso de investidores, pois não admitem a pluralidade de sócios.
Logo, o presente artigo não irá abordar questões que digam respeito às figuras acima apontadas.
Nesse sentido, iremos focar nos tipos societários que realmente são utilizados e não naqueles que existem apenas em sede de registro histórico. Descarta-se, assim, a abordagem a respeito da sociedade em nome coletivo, sociedade em comandita simples e sociedade em comandita por ações.
Esclareça-se que como a startup desenvolve atividade econômica organizada, ou seja, é uma sociedade empresária, ela não pode adotar a forma de sociedade simples. No sistema brasileiro, as sociedades ou são empresárias, ou são simples. Como dito, a startup é uma sociedade empresária.
Sociedade em comum, por sua vez, é a sociedade prévia ao registro, ou seja, não é uma opção do empreendedor. Toda sociedade, antes de ser constituída formalmente, é uma sociedade em comum.
As sociedades em conta de participação devem ser consideradas em um momento posterior. Trata-se de uma sociedade não personificada (não registrada na Junta Comercial ou no Cartório Registro de Pessoas Jurídicas), e que comumente é utilizada para viabilizar investidores-anjos. Sua utilização será abordada em outro artigo.
Logo, conclui-se que as startups devem se valer, em regra, de dois tipo societários: Sociedade Limitada e Sociedade por Ações.
São esses os tipos societários que iremos focar a seguir.
– SOCIEDADE LIMITADA
A sociedade limitada é o tipo societário mais comum no Brasil. Muitas vezes, é considerado o mais indicado para a constituição de uma startup, dada a sua simplicidade e, sobretudo, em razão da limitação da responsabilidade dos sócios.
O custo de manutenção desse tipo societário é mais baixo que de uma Sociedade Anônima. Ademais, tal tipo societário permite a adoção do regime de tributação pelo SIMPLES NACIONAL, que é vedado a uma S/A.
As regras que regem esse tipo societário se encontram, basicamente, no Código Civil (arts. 1.052 até 1.087), podendo ser regida, supletivamente, pela Lei das S/A, em caso de omissão do contrato social. Porém, é preciso ressaltar que a regência supletiva pela Lei das S/A, no estágio inicial da startup, pode acarretar alguma dificuldade, dado o caráter incipiente do negócio, considerando do caráter profissional da Lei das Sociedades Anônimas.
Sem dúvida, o principal atrativo desse tipo societário é a limitação de responsabilidade dos sócios ao valor de suas quotas, desde que totalmente integralizadas (que não pode se dar por meio de prestação de serviços). Isso porque, caso algum sócio tenha apenas subscrito suas quotas, e não as integralizado, a responsabilidade será ilimitada e solidária. Nesse hipótese, todos os sócios respondem perante credores pela parcela não integralizada. Como, em regra, ao tempo da constituição, os sócios estipulam um capital social baixo, este já é integralizado totalmente no ato de constituição, o que afasta a responsabilidade ilimitada.
Importante dizer que a responsabilidade é limitada, desde que a empresa seja exercida regularmente. Em outras palavras, a limitação da responsabilidade admite exceção em caso de desconsideração da personalidade jurídica, art. 50 do Código Civil. Ou seja, abusos e/ou fraudes ensejam a responsabilidade pessoal dos sócios, levantando-se o véu da pessoa jurídica, para atingir diretamente os sócios, não havendo que se falar em limitação de responsabilidade ao valor das quotas, pois, nestes casos, a responsabilidade é pessoal e ilimitada.
Por outro lado, se o insucesso do negócio acarretar a quebra e a insolvência da sociedade, caso os motivos da derrocada não estejam associados a fraudes e/ou abusos, a responsabilidade continuará limitada.
Deve-se dizer que a distribuição do capital social entre os sócios é de suma importância, uma vez as deliberações no âmbito da sociedade limitada têm quórum previsto em lei, que toma como base justamente as quotas do capital social de cada sócio.
No mesmo sentido, é imprescindível a correta escolha do administrador, pois este possui uma série de poderes par agir em nome da startup e que podem comprometer o futuro do negócio.
Por se tratar de uma sociedade contratual (e não uma sociedade de capital), a negociação com investidores externos não é tão simples quanto numa S/A, o que é um ponto negativo desse tipo societário.
– SOCIEDADE ANÔNIMA
A sociedade anônima é o tipo societário mais complexo, e que reclama um nível de gestão incomum para um startup, ao menos em seu estágio inicial. As regras de tal tipo estão previstas, basicamente, na Lei 6.404/76. Ao contrário da sociedade limitada (sociedade contratual), a S/A é uma sociedade de capitais. Justamente por isso, o aporte de recursos externo é mais fácil.
Neste tipo societário, o capital social é dividido em ações, e não em quotas.
Ademais, nas sociedades anônimas, os acionistas detêm responsabilidade limitada ao preço de emissão das ações que possuem, não havendo que se falar em responsabilidade solidária dos sócios por valores não integralizados, tal como na sociedade limitada. Porém, ressalte-se que a desconsideração da personalidade jurídica também pode ser aplicada às sociedades anônimas, o que acarretaria a responsabilidade pessoal dos acionistas.
Nesse tipo societário, assim como nas sociedades limitadas, a contribuição ao capital social não pode se dar por meio da prestação de serviços. Veja-se que tal restrição, previstas nesses dois tipos societários (LTDA e S/A), é bastante limitante à realidade das startups, pois o sócio não pode contribuir com a sociedade apenas com sua mão de obra. É dizer, para ser sócio, não basta a contribuição apenas com o know-how.
É necessário ressaltar que a depender da atividade a ser desenvolvida pela startup, a sua constituição exige um tipo societário específico. Como exemplo, uma fintech que atue no setor financeiro deve, necessariamente, ser constituída na forma de S/A.
Deve-se dizer que a S/A pode ser de capital aberto ou fechado, sendo que sua normatização varia, a depender disso.
Por ter normas mais rígidas, com a exigência de cumprimento de uma série de obrigações, tal tipo societário não é o mais recomendado, ao menos incialmente, para um startup. Entretanto, é comum que investidores externos exijam que a empresa se transforme numa S/A em determinados momento estratégicos. Porém, conforme apontam Feigelson e outros (FEIGELSON, 2018), um dos momentos mais comuns em que investidores exigem a conversão de uma LTDA para uma S/A é na conversão de um mútuo conversível, que é quando os investidores ingressarão de fato no quadro social da sociedade. A razão disso é que a Receita Federal tributa o ágio advindo da valorização participações societárias em sociedades limitadas, o que não acontece numa S/A, vide art. 442 do Regulamento do Imposto de Renda.
Por fim, ressalta-se que sociedades anônimas não podem optar pelo regime de tributação do SIMPLES NACIONAL.
CONCLUSÃO
Como podemos observar, não existe um tipo societário ideal para startups. Dentre os tipos mais utilizados no Brasil, sociedade limitada e sociedade anônima, ambas possuem prós e contras.
A opção por determinado tipo deve levar em consideração, principalmente, o estágio em que o negócio se encontra e a necessidade da captação de recursos externos.
Em se tratando de startups em estágio inicial, parece ser mais recomendável a opção pela sociedade limitada. Todavia, há aqueles que entendem que os fundadores devem operar sem a constituição formal da empresa até determinado momento (por ex, o fechamento do primeiro cliente) e, então, constituir-se, desde o início, em uma sociedade anônima de capital fechado.
De qualquer forma, seja qual for o modelo escolhido, a opção por um deles certamente será mais vantajosa que atuar na informalidade.
Setembrino - BRset
24/05/2023 @ 10:23
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