Como a holding familiar pode proteger (mas não blindar) seu patrimônio?
Neste artigo, iremos explicar como a constituição de um holding familiar (no caso, a holding patrimonial) poderá ser benéfica, e quais as vantagens que ela traz para segurança do seu patrimônio.
- A holding familiar como mecanismo de proteção patrimonial
A elaboração do planejamento societário e sucessório pode ser viabilizada por intermédio de vários instrumentos e institutos jurídicos. Um desses instrumentos, que atende tanto ao planejamento societário quanto ao planejamento sucessório, é a constituição de uma holding familiar.
Ordinariamente, a pessoa física empresária desenvolve uma atividade econômica, mantendo relações com seus empregados, com consumidores, com o fisco, e, ainda, com eventuais fornecedores.
À medida em que a atividade obtém êxito, a pessoa física começa a constituir seu patrimônio pessoal. Acontece que, e isso não é incomum, essa atividade pode não dar certo e “quebrar”. Logo, as dívidas contraídas poderão avançar sobre o patrimônio pessoal do empresário, que poderá ver seu patrimônio utilizado para pagar credores.
E o que a holding faz?
O mecanismo das relações mantidas é o mesmo. Ou seja, o empresário mantém relação com seus empregados, consumidores, fisco e eventuais fornecedores. Porém, à medida em que a atividade gera lucro, a formação do seu patrimônio pessoal não se dá mais em nome da pessoa física, mas em nome da holding (intitulada, aqui, de holding patrimonial), que passa a titularizar o patrimônio amealhado ao longo da vida pela pessoa física. Isso cria uma espécie de “barreira”, protegendo os bens pessoais do insucesso da atividade econômica desenvolvida.
- É uma blindagem patrimonial?!
NÃO. Conforme já dissemos em artigo anterior, entendemos não ser correto apontar a holding como mecanismo de blindagem patrimonial. Isso porque o mecanismo da holding pode ser desconsiderado em alguns casos. Ou seja, pode ser permeável em algumas ocasiões. Logo, se é algo permeável, não pode ser nomeado de “blindagem”. Por isso, muito cuidado com algumas promessas de “blindagem” patrimonial.
- Esse mecanismo não é ilegal?
NÃO. A figura genérica da holding tem previsão na Lei das Sociedades por Ações (Lei das S/A), vide art. 2º, § 3º da referida lei.
- Quando a holding poderá ser desconsiderada?
A holding patrimonial não será eficaz nos seguintes casos:
– caso quando da sua constituição, já haja credores do titular do patrimônio, pois isso poderá configurar fraude contra credores;
– caso já exista uma execução em curso contra o titular do patrimônio, pois isso poderá configurar fraude à execução;
– para proteger produto de ilícitos.
Ou seja, a holding é um mecanismo excelente para protege-lo eficazmente do insucesso ordinário da atividade empresária em face de eventuais dívidas futuras, ou seja, que foram contraídas posteriormente à constituição da holding. O negócio pode ser anterior, porém, os eventos, no caso dívidas, necessitam ser futuros.
Em outras palavras, se você já tem dívidas, execuções, ou, ainda, caso pretenda se valer deste meio para garantir o produto de atividades ilícitas, a holding não irá atender seus objetivos, por óbvio.
Isso, na verdade, é uma garantia do próprio sistema legal, que não poderia albergar, com sua chancela, meios para fraudes e cometimento de ilícitos.
- Como os tribunais têm entendido essa questão?
O Estado Brasileiro, historicamente, não tem uma cultura liberal no que diz respeito à atividade econômica, embora a Constituição Federal assim determine.
Não é incomum, principalmente na Justiça do Trabalho, vermos decisões que, sem a devida fundamentação, e sem o preenchimento dos requisitos legais para tanto, simplesmente desconsideram a personalidade jurídica das holdings, com argumentos genéricos de “grupo econômico”, “confusão patrimonial”, sem demonstrar a sua ocorrência efetiva.
Esse tipo de decisão impacta significativamente na segurança dos negócios em território nacional, afastando eventuais investidores interessados no país.
- A Lei da Liberdade Econômica
Observando o cenário acima colocado, em setembro do ano passado foi publicada a Lei da Liberdade Econômica, fruto da conversão da Medida Provisória 881.
Com o objetivo declarado de estimular o empreendedorismo e as atividades negociais em território nacional, a apontada lei enrijeceu os requisitos necessários para a desconsideração da personalidade jurídica a fim de estimular as pessoas a se lançarem em atividades negociais, conforme se vê abaixo (art. 50 do Código Civil):
“Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso.
- 1º Para os fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza.
- 2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato entre os patrimônios, caracterizada por:
I – cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa;
II – transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e
III – outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial.
- 3º O disposto no caput e nos §§ 1º e 2º deste artigo também se aplica à extensão das obrigações de sócios ou de administradores à pessoa jurídica.
- 4º A mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste artigo não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica.
- 5º Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica.”
Portanto, o que se verifica é que a partir da entrada em vigor da Lei da Liberdade Econômica (na verdade, desde a entrada em vigor da MP 881, posteriormente convertida na apontada lei), será necessária a revisão e superação do entendimento jurisprudencial que fundamenta a desconsideração única e exclusivamente com base na inadimplência/insolvência.
No que diz respeito especificamente a holding familiar, os parágrafos em negrito, em nossa opinião, são aqueles que concedem maior segurança jurídica para o planejamento societário e sucessório.
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